segunda-feira, 21 de março de 2011

Sra. Lorena, homens e (in)sensibilidade


Existe uma moça (na verdade uma “senhora” casada) chamada Lorena Portela que escreve uns textos muito bons no blog dela. Com uma leveza, vai conduzindo a reflexões e experiências muito próprias. Só que o que ela escreve, fica me acompanhando alguns dias. Deve ter sido alguma “maldição” (ou “boa-ação?!”) encontrar-me com as palavras da Sra. Portela. Fico ruminando as ideias que ela posta no blog. Às vezes faço algum comentário lá, mas as poucas palavras que cabem em um comentário nunca dão conta das várias reações que me trazem aqueles escritos. Além disso, já me disseram que comentários muito longos em blogs não são de bom tom... Resolvi então registrar minhas reações aqui, em uma madrugada que as inquietações não me deixam dormir, apesar da necessidade urgente do sono. No último texto, ela chama-nos, homens, de covardes. Inicialmente quero defender alguns do meu gênero e dizer que entre nós também há casos de “não covardes”, que eu denominaria de “não insensíveis” (ou ao menos na tentativa de não sermos...).

Eis o exemplo cotidiano citado por Lorena: “Eu tenho uma amiga muito querida que acabou de se separar depois de 3 anos de casamento e outros tantos de namoro. Na verdade, o casamento já acabou há bastante tempo. Veio acabando dia após dia, como acaba a maioria das relações mais longas. Ela, que o amava, queria, todos os dias, conversar, tentar resolver, entender ou, pelo menos, saber a razão de tantas mudanças. Ele, ali, sem conversar, sem explicar, só se afastando, mudo, implacável. Não houve salvação, nem poderia haver, nessas circunstâncias. A separação aconteceu e ela ficou com a maioria dos bens. Pelo menos os mais caros. Ele fez questão, claro, tão educado, tão polido e tão honrado”. Em seguida, a autora pede a nós, homens, que no dia do aniversário da amada não enviemos somente “UMA MERDA DE SMS, principalmente depois de tantos anos juntos. Se você não deu o que ela mais queria, então aquela fria mensagem enviada do seu celular ao custo de pouquíssimos centavos, só agrava a situação”.

Caríssima Sra. Portela, situações de indiferença e insensibilidade também me causam imenso aborrecimento, você nem imagina o quanto. E também me preocupo ao perceber que tais insensibilidades parecem ganhar território e, inclusive, serem defendidas. Não é nesse mudo que quero estar; um mundo em que o próprio umbigo é mais que suficiente (e onipotente). O filósofo Habermas já apontava que a racionalidade instrumental, o controle e a dominação parecem se estender à vida cotidiana. O psicólogo e Prof. Dr. João Francisco Duarte Júnior aponta a essa racionalidade nos dias atuais nas nossas vidas diárias e que tais relações insensíveis denotam perceber o outro como objeto. Uma estudante disse em sala de aula que no local em que ela trabalha, ninguém mais se olha nos olhos...

Duarte Júnior propõe então que haja uma “educação do sensível”, na qual haja formas inusitadas de perceber o mundo – percebendo-se a realidade a partir de ângulos variados. Fiquei verdadeiramente emocionado quando alguém que estimo imensamente disse-me recentemente que estava passando a ver a própria vida a partir de um novo ângulo. Transformações são plenamente possíveis. Estimada Sra. Lorena, obrigado por reavivar-me o encanto pela educação do sensível. Que tal ações (múltiplas e variadas) que girem em torno dessa perspectiva?

*O blog da Lorena: http://diadachica.blogspot.com/2011/03/saco-da-vergonha.html

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Cisne branco e/ou negro!?


Quando me percebo na sala de cinema sem as costas totalmente encostadas na poltrona, é o sinal mais forte que o filme me sequestrou. Isso ocorreu ao ver “Cisne Negro”, que certamente está bem distante da busca de entretenimento fácil em uma tarde de domingo. Somos conduzidos sutilmente aos pesadelos e fragilidades da protagonista, que vive os extremos das ambiguidades: ser a doce e dócil filha, a bailarina bem-sucedida, submeter-se ao rigor e disciplina da empreitada que lutou arduamente para estar; mas simultaneamente ela tem que passar a ser agressiva, decidida, livrar-se de incertezas e amarras. A esse transmutar-se ambíguo no qual a personagem tem que ser simultaneamente “cisne branco” e “cisne negro” que somos levados a acompanhar.

Acordar-se no meio da noite, subitamente, por conta de um pesadelo é uma experiência nada agradável. Sermos levados à experiência semelhante em uma sala de cinema é o mais próximo que consigo descrever dessa recente ida ao cinema; mas não o medo clássico e fácil dos filmes de terror e sim as situações cotidianas que abafavam e aprisionam a jovem bailarina, que chegam até nós nas confortáveis cadeiras, de modo a querer (e conseguir) nos envolver.

O corpo da protagonista movimenta-se de forma contínua, voluntária e disciplinada nos ensaios e espetáculo de balé. Esse mesmo corpo é conduzido, sacudido, acariciado, tocado e mexido de tal forma por quem a rodeia, que a boneca de porcelana não resiste por muito tempo, e como um frágil objeto racha-se ao meio.

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

“Fechar as portas para o que me faz mal”


Na revista “Vida Simples: para quem quer viver mais e melhor” de dezembro do ano passado (nem parece, mas 2010 já se foi...), a colunista Soninha Francine afirma que está achando ótimo ter tido a iniciativa de fechar as portas para o que faz mal a ela. É curioso como muitas vezes persistimos em “dar murro em ponta de faca”, como diz o ditado popular, insistindo em pontos de vistas e posturas que jamais se conciliarão, por serem extremamente inconciliáveis ou quase impossíveis de serem alterados. Sendo assim, a postura mais adequada e madura é se calar, se ausentar, se retirar. “Por mais que meu amor à verdade e à justiça seja uma característica da qual não pretendo abrir mão, preciso aprender a me controlar”(p.81), diz a Soninha. Como bom libriano, concordo em número, gênero e grau.


Início de ano, começo de novas fases, como o período propõe, é ocasião propícia para essas fechadas de portas e aberturas de outras novas iluminadas. Lembro-me que li sobre a origem da expressão “réveillon”: origina-se do verbo francês “réveiller”, que significa “acordar”. Quando acordamos de manhã, abrimos nossas portas para um dia iluminado (especialmente em Fortaleza); que este 2011 que se inicia possa ser assim, com portas iluminadas!


Outra matéria interessante na mesma edição dessa revista traz o texto: “Durante anos, a nossa cultura celebrou o workaholic, mas, agora, percebeu-se como esse modelo é desnecessário – para não dizer estúpido” (p. 41), em uma matéria de Rafael Tonon que destaca mudanças necessárias das nossas relações com o trabalho, visando a realização profissional. Francine e Tonon trouxeram-me reflexões úteis em suas palavras que convidam às mudanças. Aliás, já iniciei o ano fechando algumas dessas portas infrutíferas e abrindo portas relusentes. Como ainda estamos no quarto dia de 2011 ainda é tempo de desejar um feliz ano novo! (com portas iluminadas, para todos/as).