
Existe uma moça (na verdade uma “senhora” casada) chamada Lorena Portela que escreve uns textos muito bons no blog dela. Com uma leveza, vai conduzindo a reflexões e experiências muito próprias. Só que o que ela escreve, fica me acompanhando alguns dias. Deve ter sido alguma “maldição” (ou “boa-ação?!”) encontrar-me com as palavras da Sra. Portela. Fico ruminando as ideias que ela posta no blog. Às vezes faço algum comentário lá, mas as poucas palavras que cabem em um comentário nunca dão conta das várias reações que me trazem aqueles escritos. Além disso, já me disseram que comentários muito longos em blogs não são de bom tom... Resolvi então registrar minhas reações aqui, em uma madrugada que as inquietações não me deixam dormir, apesar da necessidade urgente do sono. No último texto, ela chama-nos, homens, de covardes. Inicialmente quero defender alguns do meu gênero e dizer que entre nós também há casos de “não covardes”, que eu denominaria de “não insensíveis” (ou ao menos na tentativa de não sermos...).
Eis o exemplo cotidiano citado por Lorena: “Eu tenho uma amiga muito querida que acabou de se separar depois de 3 anos de casamento e outros tantos de namoro. Na verdade, o casamento já acabou há bastante tempo. Veio acabando dia após dia, como acaba a maioria das relações mais longas. Ela, que o amava, queria, todos os dias, conversar, tentar resolver, entender ou, pelo menos, saber a razão de tantas mudanças. Ele, ali, sem conversar, sem explicar, só se afastando, mudo, implacável. Não houve salvação, nem poderia haver, nessas circunstâncias. A separação aconteceu e ela ficou com a maioria dos bens. Pelo menos os mais caros. Ele fez questão, claro, tão educado, tão polido e tão honrado”. Em seguida, a autora pede a nós, homens, que no dia do aniversário da amada não enviemos somente “UMA MERDA DE SMS, principalmente depois de tantos anos juntos. Se você não deu o que ela mais queria, então aquela fria mensagem enviada do seu celular ao custo de pouquíssimos centavos, só agrava a situação”.
Caríssima Sra. Portela, situações de indiferença e insensibilidade também me causam imenso aborrecimento, você nem imagina o quanto. E também me preocupo ao perceber que tais insensibilidades parecem ganhar território e, inclusive, serem defendidas. Não é nesse mudo que quero estar; um mundo em que o próprio umbigo é mais que suficiente (e onipotente). O filósofo Habermas já apontava que a racionalidade instrumental, o controle e a dominação parecem se estender à vida cotidiana. O psicólogo e Prof. Dr. João Francisco Duarte Júnior aponta a essa racionalidade nos dias atuais nas nossas vidas diárias e que tais relações insensíveis denotam perceber o outro como objeto. Uma estudante disse em sala de aula que no local em que ela trabalha, ninguém mais se olha nos olhos...
Duarte Júnior propõe então que haja uma “educação do sensível”, na qual haja formas inusitadas de perceber o mundo – percebendo-se a realidade a partir de ângulos variados. Fiquei verdadeiramente emocionado quando alguém que estimo imensamente disse-me recentemente que estava passando a ver a própria vida a partir de um novo ângulo. Transformações são plenamente possíveis. Estimada Sra. Lorena, obrigado por reavivar-me o encanto pela educação do sensível. Que tal ações (múltiplas e variadas) que girem em torno dessa perspectiva?
*O blog da Lorena: http://diadachica.blogspot.com/2011/03/saco-da-vergonha.html